Agroecologias e políticas no Sítio Sapopema

Vivência no sudoeste paranaense reuniu pessoas para conversar sobre formas harmônicas de se estar e se organizar nesse mundo, além de praticar bioconstrução, agroecologia e autogestão

Por Michele Torinelli / Vida Boa

 

Sapopema, nome genérico para árvores que têm as raízes pra fora. As origens à mostra. A ancestralidade aparente. Em tentativa de resgatar e recriar modos de vida em harmonia com os ciclos da vida e da terra, que é também o ciclo do corpo e do cosmos, surge esse sítio, cujo nome é uma homenagem a essa árvore-mãe. Mãe-guardiã, que zela a entrada da chácara.

Pedro Henrique Pastorello, que também se considera guardião do local, começou esse projeto há três anos, junto de sua mãe Roseli e de Vaine, companheiro dela. Pedro faz parte do Coletivo Somos Um, que agrega gentes que vivem a agroecologia em diferentes municípios da região. A chácara está localizada em Vitorino, no sudoeste do Paraná, perto do município de Pato Branco, quase na divisa com Santa Catarina – tanto que o Morro do Divisor, que demarca a fronteira entre os dois estados, fica próximo ao sítio.

O anfitrião Vaine, os milhos crioulos e o participante mais jovem

A proposta dessa vivência realizada no fim de semana de início de abril – que não é a primeira nem será a última, se as deusas quiserem – foi de formação política, além da prática em agrofloresta e bioconstrução, que não pode faltar. O esquema é de autogestão, em que todos os participantes são responsáveis pelo preparo dos alimentos, limpeza e pela realização das atividades.

As prosas políticas consistiram na apresentação do trabalho de Economia Solidária desenvolvido pelo Coletivo Somos Um por meio de CSA – Comunidade que Sustenta a Agricultura, seminário sobre Agroecologia de Base e roda de conversa de Vida Boa, Autonomia e Descolonização.

Também rolou manejo de bambu, plantio de bananeiras em área de nascente, plantio de erva mate, bioconstrução e manejo da trilha do Morro do Divisor. A faixa etária dos participantes foi de menos de 1 a mais de 60 anos.

 

Comunidade que Sustenta a Agricultura

Pedro e Jakson Gava, mais conhecido como Caxias e que também faz parte do Coletivo, contaram da sua experiência com CSA – Comunidade que Sustenta a Agricultura. É basicamente um esquema em que um grupo urbano se compromete com uma unidade agricultora e recebe cestas na periodicidade combinada com o que foi produzido no campo durante o período.

Pedro explica que muitas vezes os próprios “consumidores” se organizam na cidade e procuram o agricultor, mas no caso deles foi o contrário. Eles já tinham vendido cestas individualmente e participado de feiras, mas perceberam que era muito trabalho para pouco retorno financeiro, ou seja, praticamente inviável. “Foi aí que a gente conheceu o CSA, e foi o que salvou a gente de ir pelo caminho que todo mundo vai”, conta.

É uma lógica diferente da que rege o mercado, em que se busca soluções coletivas para problemas comuns. A base é a confiança. “Parece que quando você está vendendo um produto você está iludindo a pessoa para ela comprar”, resume Pedro. É a tônica do marketing. Ele experimentou essa dinâmica – ainda que pelas beiradas, de maneira informal – e não gostou.

Além de não precisarem convencer ninguém a comprar seus produtos, eles articulam com outros produtores locais, que fornecem o que têm à mão – como Lenoir, que apareceu no meio da vivência para entregar seus caquis. Também tentaram a certificação orgânica pela Rede Ecovida, mas além da rigidez que exige, não se identificaram com a demanda pelo “alimento bonito”, imposta pelo mercado. Afinal, a ideia de alimento bonito que muita gente tem é resultado de uma agricultura tóxica calcada em valores mercadológicos.

Fabiano Ostapiv, que já é velho parceiro do coletivo, também aderiu ao CSA e recebe as cestas. Ele destaca o aspecto da reeducação alimentar, de aprender a usar o que a natureza nos dá de acordo com o calendário natural. “Seguindo a lógica das dietas dos povos originários, o que faz bem é o que a natureza tá oferecendo naquele momento”, defende. Trata-se também de aprender a cozinhar esses alimentos, e de encontrar tempo para o ritual do preparo – algo que vai na contramão da dinâmica fast food.

Além da educação alimentar, Caxias, que puxa a frente do CSA no Sítio Aborígene, enfatiza a questão das relações humanas, do exercício de resolver as coisas em coletivo. E citou o exemplo de uma reunião que teve com as co-agricultoras e co-agricultores para redefinir os preços da cesta. Houve uma surpresa na avaliação dos preços dos alimentos: identificaram que os itens da cesta estão, em média, apenas um pouco mais caros que os “convencionais” (ou seja, nem orgânicos, nem agroecológicos) comprados nos mercados, e muito mais baratos que os orgânicos comerciais.

Citou outro exemplo: a galera tá querendo tomate. Então ele propôs: vamos atrás de como produzir tomate, pensar em estufa, irrigação, tudo juntos. É um problema comum. E ele diz ter se identificado mais com a agroecologia do que com a permacultura. “A ideia não é gerar renda com as vivências, mas com o CSA”, pondera, em relação aos muitos, e alguns caros, cursos de permacultura disponíveis no mercado alternativo. “Esse é o nosso modelo de CSA, a adaptação que a gente fez, conectado com autonomia e agroecologia”, complementa.

Outro elemento que Pedro considera importante nesse modelo de agricultura, economia e relações é o potencial revolucionário da gastronomia. “Comer coisas que estão há muito esquecidas, que não se está acostumado a comer, que não se sabe preparar”, diz. Alimentos que se sabe como foram produzidos, que algumas vezes se ajudou a plantar – sendo que as vivências também são momentos para receber os co-agricultores na terra.

“O mercado tira a importância até de você cultivar seu próprio alimento, de você saber de onde ele vem, como ele é produzido”, problematiza Pedro, referindo-se ao senso comum de que “dá muito trabalho produzir alimento”, de que “é mais fácil comprar” – sendo que é incalculável o que ganhamos colocando as mãos na terra e nos integrando ao seu ciclo. Nos reconhecer parte da natureza da qual, queiramos ou não, fazemos parte.

Pedro atende 15 co-agricultores com cestas quinzenais. Há uma lista de espera para quem quiser entrar, caso alguém saia ou para quando a produção no sítio permita agregar mais integrantes.

 

Agroecologia de Base

Valdemar Arl tem vasta experiência, prática e teórica, em agroecologia, e caminha há algumas décadas junto aos movimentos sociais do campo. Para ele, a agroecologia é muito mais que uma técnica. Envolve várias disciplinas – e vai além, porque as disciplinas não existem na realidade, na nossa experiência empírica. Essa separação é sintoma de como nós seres humanos perdemos a noção da nossa essência.

A partir de uma leitura marxista, ele entende que a essência da humanidade está nas relações de tribo, de comunidade. Com a exacerbação atual do individualismo, os vínculos de pertencimento se perdem, e até a família, esse núcleo comum reduzido, entra em crise. Entretanto, o pertencimento é uma necessidade humana. E o que rompe esses laços de convivência? O capitalismo, que cria necessidades.

“A autonomia do campesinato vai contra a lógica do sistema capitalista”, avalia Valdemar. “O camponês só é bem vindo se adere ao pacote do agronegócio – e enterra sua autonomia”, agrega. Assim, o campesinato passa a ser dependente do mercado.

Valdemar fez uma breve retrospectiva da gênese do movimento agroecológico no Brasil. Ele cita como antecessora a organização em torno do que se chamava agricultura alternativa, cujo último encontro se deu em Porto Alegre em 1989. E conta que esse movimento tinha duas raízes fortes: o movimento ambientalista (dentro do qual surgiu um conflito entre aqueles que defendiam uma “natureza sem gente”, muitas vezes denominados preservacionistas, e aqueles que entendem que o ser humano pode ter uma relação positiva com a natureza, que é o viés da agroecologia); e a outra raiz é o movimento hippie, com seu caráter contestador nos âmbitos cultural e ambiental – e até mesmo sociológico.

Em 2002 houve o primeiro Encontro Nacional de Agroecologia, e desde então se multiplicaram as associações, eventos e grupos em torno do tema. Mas o fato é que até mesmo a agroecologia vem sendo incorporada à lógica do capitalismo agrário. O próprio “selo orgânico” seria uma demanda do mercado.

“A Bayer vende aqui agrotóxicos que são proibidos lá, mas exige o selo orgânico para que os alimentos daqui possam ser consumidos na Alemanha”, exemplifica. Ele defende que é preciso reafirmar a agroecologia como movimento transformador. “É necessário recriar o movimento agroecológico no Brasil”, convoca.

Para isso, frente ao desafio conjuntural, há duas demandas: resistência estratégica (afinal, resistir tendo em vista o quê?) e revisão estratégica, pois as velhas estratégias talvez não sirvam mais. Para além das estratégias, Valdemar aponta que é preciso revisar, ou até mesmo criar, instrumentos de luta.

 

Bambuzices

Como já é tradição nas vivências puxadas pelo Coletivo Somos Um, o professor Ostapiv levou a galera pro bambuzal e compartilhou o seu conhecimento sobre essa nobre e versátil planta. No caso, uma espécie alastrante de origem chinesa. Ou seja, ao invés de dar em touceira, ela se espalha descontroladamente, o que faz com que seu plantio esteja sendo repensado em muitos lugares.

Entretanto é excelente para reflorestamento, devido à sua produção de sombra e adubação, e para contenção de assoreamento. Pode ter usos diversos: a partir de suas varas, para construção e artesanato, ou para produção de broto de bambu, uma iguaria culinária que, em conserva, lembra o palmito.

Ostapiv explica que é possível fazer dois tipos de manejo: um voltado para a quantidade de varas e outro para a quantidade de brotos. Muitas iniciativas que produzem broto comercialmente colocam bastante palha no solo, porque o broto não fica amargo quando não pega luz. Mas, nesse caso, o bambuzal fica menos denso, com menor quantidade de varas.

Com a madeira da base do bambu também é possível fazer carvão, “e é um carvão quase ativo, ou seja, purifica a água e desintoxica”, revela Ostapiv. Esse carvão pode ser usado em travesseiros, palmilhas, encostos para poltrona, além de tirar o cheiro ruim da geladeira e a umidade de modo geral.

Já a folha do bambu tem sido usada para o cabelo, pois contém flavonoides, e para chá – nem todas as espécies, mas o “bambuzinho do Himalaia”, esse amarelo bastante presente em jardins urbanos, é uma delas. Sua folha tem muito silício e ajuda a recompor o tecido cartilaginoso.

As varas boas para construir são mais velhas, e é possível identificá-las porque contêm líquens e fungos aparentes. Já as mais novas contam com uma espécie de cera branca e, muitas vezes, bainha, que são as folhas na base. Segundo o professor, há registros de uso da planta em guerras e guerrilhas – como no caso do Vietnam e em Cuba, utilizada para proteger a Baía dos Porcos da entrada de tanques inimigos.

Ostapiv conta que há 265 espécies nativas de bambu no Brasil – a segunda maior diversidade da planta no mundo, atrás somente da China. Diz que há uma tradição chinesa em que, quando a mulher quer casar, o pai vai verificar se a família do pretendente possui um bambuzal. Críticas ao patriarcado à parte, o causo revela a riqueza e segurança que a planta significa no país. Quem conta com um bambuzal tem como construir a casa, os móveis, produzir artesanato, remédio e alimento. Por isso a importância de reconhecer seu potencial, aprender a usufruir dele e cuidá-lo.

 

Vida Boa, descolonização, autonomia e mulheres zapatistas

Uma roda de conversa noturna, ao redor do fogo, iniciada com cantos sagrados e defumação com copal, uma resina mexicana utilizada em rituais. Essa foi a proposta de atividade desta que vos escreve, trazendo um pouco das reflexões de três anos de caminhada por experiências de Bem Viver. E começou assim:

Entende-se o Bem Viver andino a partir de quatro dimensões: individual, comunitária, planetária e cosmológica. E mais: essas quatro dimensões não estão separadas. A liderança Ianomami Davi Kopenawa, lá do território que hoje se denomina Roraima, exemplifica bem essa visão integradora quando diz que seu trabalho é “na comunidade, pra fora da comunidade e com o outro mundo”. Não são coisas separadas. Outro exemplo é o de Valdemar acerca da separação artificial em disciplinas, que não cabe quando falamos de agroecologia. É tudo uma coisa só. A vida. Que inclui até mesmo a morte.

De acordo com o teólogo brasileiro Leonardo Boff, o Bem Viver andino “visa uma ética da suficiência para toda a comunidade e não apenas para o indivíduo” e “pressupõe uma visão holística e integradora do ser humano inserido na grande comunidade terrenal”.

O conceito, que é colocado em prática ancestralmente pelos povos Aymara e Quéchua (que chamam o Bem Viver de Suma Qamaña e Sumak Kawsay, respectivamente) foi apropriado pelos Estados boliviano e equatoriano, incluído em suas cartas magnas a partir dos processos constituintes há cerca de dez anos, em defesa dos direitos da Pachamama, a Mãe Terra, e da autonomia dos povos originários. Mas há controvérsias se de fato suas premissas foram e estão sendo cumpridas pelos governos desses países.

A socióloga e ativista boliviana Silvia Rivera Cusicanqui diz que não dá pra aliar Bem Viver com extração de petróleo em plena Amazônia, construção de estradas em território ancestral, com impacto ambiental predatório e expulsão dos povos que ali vivem – como se faz no Equador e na Bolívia. Há uma incompatibilidade entre Bem Viver e desenvolvimentismo capitalista.

Mas, apesar do trator capitalista e colonial, há muitos povos que resistem e seguem existindo – como coloca a liderança política e espiritual da Tekoa Arandu nesse documentário, do qual pudemos ver o início durante a roda de conversa. Resistem ao processo colonizador, tão agressivo mundo afora, atacando a diversidade de povos e de tantas formas de vida. Como é também o caso histórico e atual do povo Guarani Kaiowa no Brasil, que conferimos nesse trecho do documentário Martírio.

É preciso descolonizar a nossa maneira de olhar para a nossa história, para as nossas relações entre todos os seres, para nós mesmos. É preciso descolonizar a vida.

Segundo a cosmovisão Aymara, estamos vivendo um tempo de trevas profundas, aquele momento mais frio e tenebroso antes do amanhecer. Há um termo para isso: Pachakuti. Transformação radical. Revolução. “Vulcão cósmico”, algo que se estrutura a partir da demolição de uma estrutura anterior. Esse período se deu também ao redor de 1492.

Estamos novamente nesse ponto do ciclo, e não é um processo que acontece  rapidamente como desejaríamos: o amanhecer não se dá de uma hora pra outra. É um longo parto. Seremos capazes de transformar essa morte em renascimento?

Uma experiência bastante inspiradora que também utiliza essa metáfora da noite profunda antes do amanhecer é o movimento zapatista, localizado no sudeste mexicano e que move corações revolucionários mundo afora. O levantamento zapatista, em 1° de janeiro de 1994, é conhecido como um divisor de águas, um antes e depois frente ao neoliberalismo. E, 25 anos mais tarde, segue firme, radicalmente coerente e inspirando autonomias mundo afora.

De uma apatia frente à crença predominante no “fim da história”, segundo a qual o capitalismo seria o auge insuperável de evolução da humanidade, indígenas do estado de Chiapas inauguraram uma onda mundial de lutas que denunciaram a globalização capitalista como o mais refinado mecanismo de exploração dos seres humanos e não humanos. E, destacadamente no caso zapatista, não se restringiram à denúncia: transformaram seus mundos, atuando em seus territórios por meio da autonomia e do autogoverno em prol da justiça e da dignidade humana, em defesa de “um mundo em que caibam muitos mundos”, em que nenhum sistema que tenha como objetivo e prática hegemonizar e homogeneizar os modos de vida nesse ainda tão diverso planetinha consiga se impor.

E, enquanto existir tal sistema opressor, haverá resistência. Haverá luta. Uma guerra para que não existam mais guerras, como anunciaram em seus comunicados. O EZLN – Exército Zapatista de Libertação Nacional atuou apenas uma vez, para a retomada de terras e imposição de respeito à sua autonomia. Nunca mais emitiu um tiro desde os primeiros dias de 1994.

O termo “zapatista” vem de Emiliano Zapata, emblemático revolucionário mexicano que ao lado de Pancho Villa e outros comparsas derrubou o governo mexicano mas se recusou a assumir o poder, que deveria pertencer ao povo. Este ano se completa um século desde que foi assassinado pelos traidores. Terra, justiça e liberdade continuam sendo as consignas revolucionárias, como se pode ouvir numa declaração dos atuais zapatistas, reproduzida na famosa música de Manu Chao.

Cheguei nesses territórios revolucionários para o I Encontro Internacional Político, Artístico, Esportivo e Cultural de Mulheres que Lutam, realizado em março do ano passado. Depois disso, pude participar de seminário de avaliação da pré-candidatura independente à presidência do México lançada pelo Congresso Nacional Indígena, do qual o movimento zapatista faz parte, que teve como representante de seu Conselho Indígena de Governo (ao invés de um partido) uma mulher indígena erveira: Marichuy.

Mulheres na lida no Sítio Sapopema

Pude compartilhar nessa roda no Sítio Sapopema um pouco do aprendizado com essas fortes comunidades e, em especial, as mulheres, que desde 1994 fizeram a primeira revolução dentro da revolução zapatista. Uma luta contra o capitalismo patriarcal, em que as mulheres são submetidas, assim como a terra.

Para acabar com as relações de dominação entre diferentes povos, entre diferentes classes, entre diferentes espécies, é preciso acabar com a histórica e violenta dominação de homens sobre mulheres. “E ninguém vai nos dar isso, companheiras”, disseram as zapatistas: “nem o patrão, nem o marido, nem o partido”. É preciso conquistar essa liberdade. E isso só é possível nos fortalecendo entre nós, mas cada uma do seu jeito, a seu modo, a seu tempo, em seus lugares, com suas gentes. E envolvendo a comunidade, até mesmo os homens, nessa luta anticapitalista e antipatriarcal.

Contei sobre o Encontro de Mulheres que Lutam nesse relato, e da vivência em comunidade zapatista aqui. Outras ricas experiências que não tive tempo de compartilhar nessa roda foram do Assentamento Contestado, referência de agroecologia no Paraná, da Escola Latino Americana de Agroecologia e da universidade popular campesina bioconstruída em Santiago del Estero, província do noroeste argentino.

 

Turismo de Base Comunitária

A última atividade da vivência foi a subida e o manejo da trilha do Morro do Divisor. Pedro explica que “o objetivo é chegar no Turismo de Base Comunitária, que assim como o CSA, devido à contribuição com produtos locais, desde que naturais, para completar as cestas, é uma frente que incentiva os vizinhos a preservarem as matas e a biodiversidade nas plantas cultivadas, pela possibilidade de vender produtos no local”.

Gruta na trilha do Morro do Divisor [foto de Charlane Larissa Dresch Carletto]

O ecoturismo com viés comunitário é uma outra frente de luta e resistência do Sítio Sapopema, tal como o CSA. “Identificamos um grande potencial na região, e o mais importante de tudo é que esse é um caminho pra atingir um consenso de Manejo de Microbacias Hidrográficas, que na prática precisa de envolvimento populacional, municipal e de órgãos distintos”, acredita Pedro.

Ele explica que a área do Morro do Divisor é circundada por duas microbacias, e uma delas dá origem ao Rio Caçador. “Como estamos numa região que é cabeceira de água, se a área preservação for ampliada, as águas produzidas no Alto Caçador podem, por exemplo, abastecer um município abaixo, a própria Vitorino, tendo um baixo custo de tratamento e alta qualidade”, defende.

Pedro entende que o Turismo de Base Comunitária é uma ação que permite mobilizar a comunidade para isso. E complementa:

A trilha que sobe o Morro do Divisor passa por um paredão rochoso, conhecido por gruta, e outros afluentes do Rio Caçador. Analisando a manifestação das águas é possível perceber, nos morros e montanhas, a dinâmica no contexto de acumulação, infiltração e “brotação” (nascentes) e a função que a vegetação cumpre com o solo, atmosfera e água.

Resquícios de árvores centenárias aglomeram-se em alguns pontos da face norte do Morro do Divisor, como sapopemas, guaviroveiras, pitangueiras, jabuticabeiras, angicos, jerivás, entre outras. Entretanto, o histórico da área foi de exploração de madeira, roçadas e queimadas, roças de seva (milho para engorda de animais) e até os dias de hoje ainda é ilegalmente utilizada para caça. Na floresta, ainda jovem, predominam espécies pioneiras de grande porte que podem ser manejadas racionalmente, abrindo espaço para o crescimento das espécies clímax. É preciso reintroduzir a araucária em toda a região. O pinheiro tem pouca capacidade de se proliferar sem a intervenção da fauna, que também já foi em grande parte extinta. A araucária foi e continua sendo vítima da ganância humana.

Sapopema entre araucárias [foto de Charlane Larissa Dresch Carletto]

Zona Autônoma Temporária

Pudemos vivenciar por alguns dias o que é ser comunidade, criando um espaço-tempo comum temporário, como preconiza Hakim Bey, o arauto das Zonas Autônomas Temporárias. Além das prosas, isso se deu por meio da mão e do pé na terra nas práticas de bioconstrução, do plantio, das experiências culinárias, das rodas que se tecem entre nossas mãos dadas – e dos cuidados, diálogos e trocas coletivas nesses dias, em que estivemos fora do consumismo e do produtivismo vazio da rotina do capitalismo urbano.

Pés vermelhos, corpos cansados, mentes e corações provocados por anseios comuns. Ancestrais. Latentes em cada um.

Anseios de vida boa. De vida plena. Entre todos os seres.

 

Para saber sobre as próximas vivências do Coletivo Somos Um, acompanhe as páginas do Sítio Sapopema e do Sítio Aborígene.

 

Contato:

[email protected]

(46) 98821-2480 (WhatsApp)

 

 

 

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Vivência Aborígene

Tudo e nada ao mesmo tempo na Vivência Aborígene

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